Por: Neusa Baptista Pinto*
O ativismo das mulheres negras nasceu antes do feminismo. Em um país racista como o Brasil, essa afirmação precisa ser repetida ad infinitum e o protagonismo das mulheres negras na construção da luta das mulheres precisa ser lembrado.
Para falar sobre isso, neste mês de março, é preciso voltar para o lugar onde esta luta começou, resgatando a trajetória do movimento de mulheres negras.
Segundo os dados mais recentes do IBGE, do ano de 2019, 42,7% dos brasileiros se declararam brancos e 56,2%, negros (46,8%, pardos e 9,4%, pretos), além de 1,1% de amarelos ou indígenas. As mulheres compõem 51,8% da população, que soma 212 milhões de habitantes.
Há cerca de 55,6 milhões de mulheres negras no Brasil. Em Mato Grosso, são mais de um milhão e, em Cuiabá, quase 200 mil. Um contingente expressivo da população que, no entanto, não possui um grau equivalente de representatividade nos espaços de poder.
Elas aparecem nas estatísticas oficiais e no pensamento social em posições desfavoráveis. Estão mais expostas à agressão; são maioria entre as vítimas de feminicídio; quando gestantes, estão mais sujeitas a complicações e de óbito no parto; no mercado de trabalho, estão em posições de menor prestígio e remuneração.
São, como diz a pesquisadora Vânia Maria da Silva Bonfim, o segmento “primariamente subalternalizado da sociedade brasileira”. Daí a importância de resgatar sua história de resistência.
Embates no movimento negro
Muitos pesquisadores se dedicam a dar visibilidade à capacidade de organização destas mulheres, entre eles pensadoras negras do Brasil e de outros países. Esta capacidade surge não da luta contra a escravização, nem da organização nos primeiros coletivos femininos negros, no início do século XX. É herança das sociedades africanas de onde elas vieram, nas quais a mulher exerce papel central.
Segundo o artigo “A identidade contraditória da mulher negra brasileira: bases históricas”, de Vânia Bonfim, desde 8 mil anos antes de Cristo, no período Neolítico, as sociedades africanas já se organizavam de maneira complexa, tendo as mulheres como centro de sua estrutura social (sociedade matricêntrica).
“Essa força do universo feminino é um indício de quanto a posição social da mulher era elevada. Mas até no político [...] a ubiquidade da figura da rainha-mãe implicou, desde o período egípcio faraônico até o início da colonização na metade do século XIX, uma partilha efetiva do poder político”, diz ela.
Estas mulheres trilharam os primeiros caminhos do feminismo, ainda que na condição de escravizadas.
De que maneira?
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