Em sessão com a presença da secretária municipal de saúde de Cuiabá, Ozenira Félix, nesta terça (27) na Câmara Municipal, para prestar esclarecimentos sobre os medicamentos vencidos encontrados no Centro de Distribuição de Medicamentos e Insumos (CDMIC), a vereadora Edna Sampaio (PT) cobrou da pasta medidas contra as irregularidades envolvendo as empresas privadas contratadas pelo executivo para a gestão do sistema.
Segundo ela, a interferência dos interesses particulares na condução das políticas está na raiz desta e de outras irregularidades.
Durante a reunião, a SMS voltou a justificar que há um processo administrativo para apurar o fato, o qual foi instaurado em outubro de 2020, quando Ozenira Félix assumiu o cargo, e sobre o qual não poderiam ser prestadas informações, pelo fato de correr em sigilo.
A pasta prometeu ampliar a equipe de trabalho envolvida nos levantamentos e apresentar, até sexta feira, um cronograma e, posteriormente, um relatório com mais informações.
Edna Sampaio disse considerar absurda a ausência de informações sobre o contrato com a empresa Norge Pharma, responsável pela administração do CDMIC, o qual prevê a apresentação de relatórios periódicos da empresa ao executivo.
A vereadora disse reconhecer as agressões raciais sofridas pela secretária Ozenira, mas que é preciso separá-las das críticas à administração.
“A questão que está posta não é racial. É um desserviço para a luta racial confundir as denúncias que foram feitas, que podem ter razões muitas, mas que são graves, em seu escopo e em seu fundamento, e é preciso enfrentar as questões que estão postas sobre o acúmulo de medicamentos que estão estocados, com prazo vencido, inclusive medicamentos que, conforme a denúncia, estão dentro do período de sua gestão”, disse ela à secretária.
Edna se disse solidária à sua condição de mulher negra no espaço da política, mas alertou para o perigo de desviar o debate para a questão da discriminação racial, e deixar de discutir o problema principal, a privatização do SUS e o predomínio do interesse privado.
Um dos exemplos, segundo ela, é que, segundo balanço da própria SMS, apresentado à Câmara na semana passada, apenas 1,61% de todos os procedimentos realizados no sistema acontecem no nível da atenção básica, o que demonstra os interesses das empresas pela fatia mais lucrativa do mercado, a dos hospitais.
“Conheço a secretária, sei de sua idoneidade, como mulher negra de luta, batalhadora, mas não podemos passionalizar esse debate, sob pena de colaborar com a crueldade dos homens brancos que fazem da saúde o seu negócio. O problema que está colocado é o da privatização do SUS”, disse ela.
Segundo a vereadora, assim como a privatização favorece irregularidades na gestão de medicamentos, também promove outros problemas, como a precarização do trabalho entre os profissionais da saúde.
“Se ampliarmos o enfoque para outras empresas que abocanham o sistema único de saúde, tornando-o inviável e impossível de chegar as políticas públicas às pessoas que mais precisam, vamos entender o quanto os homens brancos, por trás de uma secretária negra, se apropriam desse espaço público, do recurso público, e condenam a população ao descaso, à morte”.
Edna opinou ainda que a perda de medicamentos afeta justamente os negros, que são maioria entre os afetados pela Covid-19.
“As denúncias que estão sendo feitas são graves e afetam o povo preto que está sem medicamento, assim como eu tenho dito que afeta o povo preto a centralização da vacina, que impede as pessoas mais pobres, de maioria preta e parda, de chegar aos postos de vacinação”, disse ela.
“Temos que fazer nosso papel enquanto mulheres negras nos espaços de poder, mudar a lógica e não acobertar os homens brancos, que querem utilizar a nossa figura como desculpa, como justificativa, para os seus negócios, que têm imposto à população o sofrimento”.
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